terça-feira, 26 de outubro de 2010
terça-feira, 19 de outubro de 2010
O eterno retorno
"E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: "esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes; e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indizivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e seqüência - e do mesmo modo essa aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez - e tu com ela, poeirinha da poeira!" Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasse assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderias: "Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!" Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse; a pergunta, diante de tudo e de cada coisa: "Quero isto ainda uma vez e ainda inúmeras vezes?" pesaria como o mais pesado dos pesos sobre teu agir! Ou, então, com terias de ficar de bem contigo e mesmo com a vida, para não desejar nada mais do que essa última, eterna confirmação e chancela?"
Nietzsche - A Gaia Ciência (1978: 208)
Reflita por um instante: Sua vida, até o dia de hoje, lhe é satisfatória o suficiente? Você aceitaria, de bom grado, o desafio do demônio de Nietzsche? Viveria, com alegria e entusiasmo, essa sua mesma vida, “ainda uma vez e ainda inúmeras vezes?”
O conceito do eterno retorno é visto pelo próprio Nietzsche como um de seus pensamentos mais aterradores. Porém, por mais soturnas que tais perguntas, em princípio, possam soar, pode-se dizer que elas guardam em si a sólida visão ética de seu autor, para quem o homem é e será o juiz de sua própria existência, e deve estar atento às suas decisões, que, uma vez tomadas, valem para todo o sempre.
Nesse sentido, ele afirma que não se pode crescer sem que se tenha vencido medos e escalado declives. Somente a consciência de quem é, o que quer e o que pode fazer perante seu destino empurra o homem para cada vez mais longe de seus limites, da mediocridade tentadora e das preocupações e superstições inúteis de uma sociedade envenenada. Livre de todo o peso estéril, o homem que passa pela vida como um dançarino, um jogador, um aventureiro que acena afirmativamente e com segurança para o porvir, não conhecerá arrependimentos.
Se esse inusitado demônio corre o risco ou não de surgir diante de qualquer um de nós, realmente não importa. O importante é, através desse exercício especulativo, redescobrirmos, o quanto antes, o valor do tempo que nos cabe e o peso enorme das minúsculas coisas que fazem parte de nossa preciosa eternidade cotidiana.
Os homens não têm de fugir à vida como os pessimistas, mas como alegres convivas de um banquete que desejam suas taças novamente cheias, dirão à vida: uma vez mais”.
Nietzsche
terça-feira, 12 de outubro de 2010
Art Déco - Ainda viva, no fundo do oceano...
O movimento art déco foi uma mistura de vários estilos e propostas surgidas no início do século XX. Ele não afetou apenas a arquitetura, mas todas as artes plásticas e as chamadas artes aplicadas: móveis, esculturas, moda, joalheria e design gráfico.
O art déco possui esse nome porque não foi motivado por intenções filosóficas ou políticas. Sua proposta elegante e funcional era puramente decorativa. Pode ser visto como uma adaptação generalizada dos princípios do modernismo e da vanguarda do século XX, principalmente, da pintura cubista e suas formas geometrizadas. Predominam as linhas retas, triangulares ou circulares estilizadas e o design abstrato. Entre os motivos mais explorados estão os animais e as formas femininas. Nesse sentido, pode-se afirmar que o art déco foi uma tentativa de modernização da rebuscada art nouveau e suas linhas sinuosas e ornamentos florais.
O art déco possui esse nome porque não foi motivado por intenções filosóficas ou políticas. Sua proposta elegante e funcional era puramente decorativa. Pode ser visto como uma adaptação generalizada dos princípios do modernismo e da vanguarda do século XX, principalmente, da pintura cubista e suas formas geometrizadas. Predominam as linhas retas, triangulares ou circulares estilizadas e o design abstrato. Entre os motivos mais explorados estão os animais e as formas femininas. Nesse sentido, pode-se afirmar que o art déco foi uma tentativa de modernização da rebuscada art nouveau e suas linhas sinuosas e ornamentos florais.
O estilo aplicado a objetos, detalhes arquitetônicos e decoração de interiores
Inicialmente, o art déco apresenta-se como um estilo luxuoso, destinado à burguesia enriquecida, a despeito – ou por conta – da 1ª Guerra Mundial. Foi a época do jade, laca e marfim, das cores quentes, das confecções do estilista e decorador Paul Poiret, dos vestidos “abstratos” de Sonia Delaunay, dos vasos do conceituado René Lalique... A partir de meados da década de 30, o movimento passa a ser assimilado pelo ainda emergente mercado industrial, que utiliza materiais e formas passíveis de serem reproduzidos massivamente. Era a vez do concreto armado, do compensado de madeira e do aço tubular. O povo agora convivia com a estética art déco através de cartazes de publicidade, bijuterias, mobiliário e simples objetos de uso doméstico.
Art déco na arquitetura - A marca das grandes metrópolis americanas no início do século XX
A despeito de suas origens francesas, os motivos e padrões art déco se expandiram rapidamente por toda a Europa e pelos Estados Unidos. Em relação à arquitetura, há diferenças entre o estilo utilizado em Miami – marcado por formas mais puras e pouca ornamentação - e o estilo utilizado em Nova Yorque e Chicago – ricamente ornamentado e dotado de elementos metálicos.
Art déco brasileira: Torre do Relógio da Central do Brasil, Estação Ferroviária em Goiânia e o Cristo Redentor, a maior escultura Art Déco do mundo
Pode-se situar o auge do art déco no louco período entre as duas Grandes Guerras, ou ainda, de 1920 a 1939. Mas, apesar de seu declínio a partir de então, sem esforços, observa-se ainda sua sólida influência através dos anos 40, cinquenta, ou mesmo 60. Na verdade, assim como ocorreu com muitos outros movimentos, sua influência permanece nos trabalhos de muitos artistas contemporâneos.
Releituras do estilo por artistas atuais
Esse é o caso dos jogos da franquia “Bioshock”. Destinados a serem dois dos mais bem sucedidos jogos da década, eles tem como cenário uma cidade submersa – Rapture, que significa êxtase - construída em uma década de 40 alternativa, para servir como o paraíso de uma elite intelectual. Porém, anos depois, quando o único sobrevivente de um acidente de avião descobre essa utopia submarina, encontra-a caótica e derrotada, ela própria uma entidade insana e curvada sobre si mesma. Os muros estão desmoronando. Aqui e ali, rachaduras nas abóbadas de vidro permitem a lenta, porém, inexorável, invasão das águas do oceano. Pelos corredores e salas amontoam-se cadáveres. Dentre os vivos, aqueles que foram, um dia, os melhores e mais brilhantes do mundo acima são agora loucos mutantes que correm cegamente pelos salões arruinados...
Cenas de Bioshock: beleza entre ruínas, violência e caos...
...detalhes que dão forma a um mundo inesquecível
Ao desenhar a cidade, Hogarth De La Plante, principal artista conceitual dos ambientes do jogo, escolheu o visual art déco, influenciado pelos prédios de Manhattan. “Art déco foi um triunfo do homem sobre a natureza”, disse ele, acrescentando que muitas construções do jogo são monstruosas, não-naturais e possuem muitos ângulos retos que evocam a imagem de escadarias que as pessoas poderiam galgar para chegar ao paraíso.
O artista diz que esse é o visual perfeito, não apenas porque se encaixa na linha do tempo proposta pela história do jogo, mas porque “Rapture é uma cidade onde os homens são incríveis a ponto de construírem-na sob as águas, ambiente naturalmente hostil a eles”. De La Plante diz gostar da maneira como se encaixa o colapso físico da cidade, enquanto a sociedade em Rapture também desmorona.
Quem vive alguns momentos no universo do jogo percebe que todo o aspecto art déco de Bioshock não se restringe apenas à arquitetura. A decoração dos interiores e os objetos também sofreram significativa influência do estilo. Porém, após um mergulho mais profundo, percebe-se que Rapture é mais do que isso. Art déco ali não se limita à decoração. Cada cartaz, cada salão grandioso ou pequeno cômodo conta uma história. São fragmentos de um sonho fracassado que ligam jogador e obra sob um espectro emocional envolvente, que intensifica-se a cada nova descoberta. E ainda há mais. Há steampunk e futurismo. Há elementos contemporâneos, embora representados por metáforas. Há arte, que, por definição, se alimenta da vida e, por que não, dela própria, sempre e inevitavelmente emergindo diante de nós como algo único.
O artista diz que esse é o visual perfeito, não apenas porque se encaixa na linha do tempo proposta pela história do jogo, mas porque “Rapture é uma cidade onde os homens são incríveis a ponto de construírem-na sob as águas, ambiente naturalmente hostil a eles”. De La Plante diz gostar da maneira como se encaixa o colapso físico da cidade, enquanto a sociedade em Rapture também desmorona.
Quem vive alguns momentos no universo do jogo percebe que todo o aspecto art déco de Bioshock não se restringe apenas à arquitetura. A decoração dos interiores e os objetos também sofreram significativa influência do estilo. Porém, após um mergulho mais profundo, percebe-se que Rapture é mais do que isso. Art déco ali não se limita à decoração. Cada cartaz, cada salão grandioso ou pequeno cômodo conta uma história. São fragmentos de um sonho fracassado que ligam jogador e obra sob um espectro emocional envolvente, que intensifica-se a cada nova descoberta. E ainda há mais. Há steampunk e futurismo. Há elementos contemporâneos, embora representados por metáforas. Há arte, que, por definição, se alimenta da vida e, por que não, dela própria, sempre e inevitavelmente emergindo diante de nós como algo único.
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
Livros de Artista
“Veja o mundo num grão de areia,
veja o céu em um campo florido,
Guarde o infinito na palma da mão,
E a eternidade em uma hora de vida!”
veja o céu em um campo florido,
Guarde o infinito na palma da mão,
E a eternidade em uma hora de vida!”
William Blake
O livro de artista é um tipo de produção que nasceu durante o movimento modernista, quando se começou a fazer uso de novos meios para a concretização da arte. Foi bastante utilizado por grandes nomes da época, como Marcel Duchamp, Kasimir Malevich, Vicente do Rego Monteiro e, principalmente, pelos artistas das chamadas “poéticas visuais”, que trabalham os aspectos gráficos e pictóricos das palavras, redescobrindo-as, também, como imagens.
Esse é um tipo de produção que explora plasticamente as qualidades específicas do livro convencional, como a serialidade e o fluxo sequencial de ideias. Pode ser feito do papel mais barato ou mesmo de outro material, completamente diferente. Pode conter séries fotográficas, dobraduras, colagens, converter-se, quando aberto, em uma escultura de papel... Quanto à temática, seu caráter pode ser autobiográfico, filosófico, narrativo ou puramente estético.
Um flipbook é uma subespécie de livro de artista. É uma obra de arte encadernada como um livro, contendo, em cada página, imagens relacionadas entre si, planejadas para gerarem ilusões óticas – mais comumente, de movimento - tão logo seja folheado.
Esse é o princípio dos desenhos animados. Fazer um flipbook, ou assistir ao funcionamento de um, pode ajudar bastante na compreensão dessa arte. De fato, não é raro encontrar crianças que já tenham feito sua própria animação, à caneta, nos cantos de seus cadernos escolares.
“Arco-íris em suas mãos” é o título do curioso flipbook criado pelo diretor de arte japonês Masashi Kawamura. O fascinante brinquedo de papel possui 36 páginas, totalmente negras, sobre as quais se alinham alguns pequenos quadrados coloridos. Apenas isso. Mas, ao se folhear o livro, descobre-se que este simples material basta para que surja, em pleno ar, um pequeno arco-íris:
Esse é um tipo de produção que explora plasticamente as qualidades específicas do livro convencional, como a serialidade e o fluxo sequencial de ideias. Pode ser feito do papel mais barato ou mesmo de outro material, completamente diferente. Pode conter séries fotográficas, dobraduras, colagens, converter-se, quando aberto, em uma escultura de papel... Quanto à temática, seu caráter pode ser autobiográfico, filosófico, narrativo ou puramente estético.
Um flipbook é uma subespécie de livro de artista. É uma obra de arte encadernada como um livro, contendo, em cada página, imagens relacionadas entre si, planejadas para gerarem ilusões óticas – mais comumente, de movimento - tão logo seja folheado.
Esse é o princípio dos desenhos animados. Fazer um flipbook, ou assistir ao funcionamento de um, pode ajudar bastante na compreensão dessa arte. De fato, não é raro encontrar crianças que já tenham feito sua própria animação, à caneta, nos cantos de seus cadernos escolares.
“Arco-íris em suas mãos” é o título do curioso flipbook criado pelo diretor de arte japonês Masashi Kawamura. O fascinante brinquedo de papel possui 36 páginas, totalmente negras, sobre as quais se alinham alguns pequenos quadrados coloridos. Apenas isso. Mas, ao se folhear o livro, descobre-se que este simples material basta para que surja, em pleno ar, um pequeno arco-íris:
Em vídeo pode-se observar melhor como se dá a impressionante ilusão:
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